Domingo
É tudo tão previsível e sem sentido.
Os corpos, ainda cansados, preparam-se para a rotina de toda segunda.
Outros, depois de um dia trabalhoso, arrumam espaço para ocupar-se mais um
pouco.
E lá se vão, à missa dos domingos. Sapatos engraxados e roupas
engomadas, dobrar os joelhos e agradecer pelo trabalho que os esperam no
amanhã.
Amanhã é segunda. Hoje é domingo.
E no domingo tem missão. Agradecer pela migalha de cada dia, e implorar
forças para aguentar a escravização dos dias seguintes.
Há tempos que não se sabe do amanhã. Disputam-se, uma mísera diária,
para não morrerem de fome. Sem lenço e sem documento, carregam o peso do
desamparo.
Os corpos carcomidos pelas mazelas e humilhações; pela falta de
cuidados, de nutrientes adequados à saúde, vão se definhando, silenciosamente.
Tudo vai se definhando, para o indivíduo na sarjeta. Seus dentes, sua
saúde, sua moral. Sua capacidade de compreensão e resistência ao abuso do
poder, é anulada pelo próprio poder.
E prosseguem os Joãos ninguém, invisíveis e sem vozes, nesse mundo
desordenado, tecendo apenas o rude trabalho. Os ombros suportam o mundo?
Há que se perguntar ao poeta.
Zélia Siqueira – Jornalista e artista visual.
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