domingo, 16 de junho de 2024


Domingo

 

 



É tudo tão previsível e sem sentido.

Os corpos, ainda cansados, preparam-se para a rotina de toda segunda. Outros, depois de um dia trabalhoso, arrumam espaço para ocupar-se mais um pouco.

E lá se vão, à missa dos domingos. Sapatos engraxados e roupas engomadas, dobrar os joelhos e agradecer pelo trabalho que os esperam no amanhã.

Amanhã é segunda. Hoje é domingo.

E no domingo tem missão. Agradecer pela migalha de cada dia, e implorar forças para aguentar a escravização dos dias seguintes.

Há tempos que não se sabe do amanhã. Disputam-se, uma mísera diária, para não morrerem de fome. Sem lenço e sem documento, carregam o peso do desamparo.

Os corpos carcomidos pelas mazelas e humilhações; pela falta de cuidados, de nutrientes adequados à saúde, vão se definhando, silenciosamente.

Tudo vai se definhando, para o indivíduo na sarjeta. Seus dentes, sua saúde, sua moral. Sua capacidade de compreensão e resistência ao abuso do poder, é anulada pelo próprio poder.

E prosseguem os Joãos ninguém, invisíveis e sem vozes, nesse mundo desordenado, tecendo apenas o rude trabalho. Os ombros suportam o mundo?

Há que se perguntar ao poeta.


Zélia Siqueira – Jornalista e artista visual.

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