sábado, 13 de maio de 2017

Um caso de amor com a natureza





                                                                                                                   
Ao ler a crônica, "A respeito de árvores e de Katmandu", da nossa querida escritora, Bernadette Lyra, me vi mais uma vez, possuída deste mesmo sentimento que a emocionou e que, confessadamente, a finaliza manifestando: "eu chorei feito criança a quem roubam o brinquedo de maior estimação". Sentimento este revelado diante da dispare e cruel realidade desses novos tempos de incertezas e contradições. E, como  dizia Drummond, "a vida não pesa mais que a mão de uma criança"; então navegar é preciso, já dizia o poeta maior, já que viver não o é.

Parece que o sentido da vida vai diluindo a cada momento, com maior velocidade nesse bonde chamado desejo, de ter e não de ser. "Caminhar, observar e imaginar", são atos solitários e silenciosos de seres lúdicos que sonham em voar, ainda que com uma só asa, e voam... Voam ao encontro de suas próprias profundezas interiores que os tornam tão gigantes, nesse trem que descarrilha ladeira abaixo.


Como a cronista, também chorei ao regar as árvores com a pouca água de uma terra seca, do lugar de minhas origens; que em outros tempos era terra de floresta e de animais. E vendo suas copas frondosas em festa com os pingos d'água que jorravam em suas folhas, me encontrei em estado de epifania. As abracei, acariciei e, num cúmplice diálogo de irmandade, derramei lágrimas numa comoção que só habita os seres sensíveis. Momento em que não pude deixar de relembrar daquela árvore florida que avistava da minha varanda urbana, onde a passarada fazia morada.
Pardais e bem-te-vis cantarolavam suas melodias naqueles dias outonais daquela cerejeira em flor, com beleza grandiosa e deslumbrante, que encantava as minhas manhãs. Enquanto saboreava o café para a lida de um novo dia, apreciava a sinfonia dos pássaros em festa, naquela aquarela rosa em flor, que me confundia com o impressionismo dos Jardins de Monet.
Eis que neste outono me deparo com sua ausência. Aquela bela árvore, que foi exílio de tantas aves expulsas do paraíso, que migram para as cidades em busca do alimento - já que o seu habitat natural foi desconfigurado - foi arrancada para dar lugar à especulação imobiliária e ao acúmulo de riquezas centrado em tão poucas mãos, enquanto muitos nada têm.

A magia se despediu. Já não é a mesma sinfonia os cantos da passarada. "As aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá", já dizia Gonçalves Dias e, parafraseando Paulinho, onde bem-te-vis andavam por um jardim em flor, enquanto eu chamava os bichos de amor...




Zélia Siqueira

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