domingo, 30 de junho de 2019

UM OLHAR FRUTÍFERO








                                        Foto de Zélia Siqueira


Se olharmos detidamente, permitindo que o olhar desconstrua o modo como nos acostumamos a olhar as coisas, nos deparamos com uma linguagem própria daquilo que observamos, mas que poucos conseguem perceber. Sentimos a presença de elementos, que compõem essa linguagem, num todo.

Um fruto é composto de doçuras e acidez; cores e texturas; manchas e pequenas linhas que, espaçadamente, criam espaços abertos ou se fecham em si mesmas. Conduzem-nos a universos que dialogam com nosso espírito.

Hoje, ao descascar um cajá, colhido ainda sem madurar por completo, me detive diante de sua forma e de todo um conjunto que, ao observar, fez-me pensar que os frutos têm uma ética própria. Uma ética da natureza.

A casca era verde, mas a polpa, com veios esverdeados, já estava amarelada. Um fruto, ao brotar, tem uma outra cor; até chegar nessa que os olhos alcançam. Um amarelado ouro.

Diante do dourado do cajá, com suas linhas e forma arredondada, penso no estágio de transmutação  dos frutos e da vida, quando nasce e cresce. Quando alcançam cores que nossos olhos, ao observar, sentem tocar o coração e o espírito.

Os frutos passam por tons até alcançar a madurês, para alimentar os animais, incluindo nós, os humanos. Cada cor tem uma função num fruto que nos alimenta e nos fortalece. E as cores misturadas e vivas, trazem vitaminas que fortalecem  o nosso corpo feminino, mas também o masculino.

Portanto essa ética da natureza é uma ética de inclusão. Ao contrário dos humanos, que centram na sua individualidade e a destrói. Talvez os humanos devessem aprender com a natureza. Esquecer o que aprendeu e reaprender junto com ela. Onde houvesse uma transmutação no sentido de um todo; que alcançasse as cores que nossos olhos, ao observar, deixassem tocar o coração e o espírito.

A natureza esconde segredos nos frutos que alimentam o corpo, esteio da alma. E, por outro lado, abre-se para quem dela se aproxima com reverência, respeito e afeto.

A natureza sou eu junto com ela. Quem esquece que esqueceu, nada sabe de si e, muito menos, sobre ela.


Zélia Siqueira – formada em jornalismo e artes, é fotógrafa, escritora, poeta e pintora.

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