Sigmund Freud, (Estudos sobre a histeria): depois de ter
estudado Lacan, durante algum tempo, com um grupo de psicanalistas, estou diante de um pensador, escritor, médico,
experimentador que posso chamar de clássico. Seu estilo é nítido, apolínico, não há grandes exaltações, mas o que aparece
é uma moderação, uma prudência; ao contrário do seu discípulo mais famoso: Dr.
Lacan; barroco, aliás, primoroso à sua maneira.
Freud soube “olhar”. Diante de um caso clínico, ele não se
deixa levar pela subjetividade e se adiante com uma prudência a respeito e, com
respeito da pessoa analisada. Só me surpreende o uso da hipnose no tratamento
da histeria, porque isso não me parece muito científico e lembra os
hipnotizadores de feiras ambulantes, “Freud e sua bola de cristal”?!
E aí começa o festival Freud: sob hipnose ele consegue o que não conseguiria no
estado dito normal; porque na hipnose é o inconsciente que fala sem as censuras
do consciente (mas há o perigo do hipnotizador fazer do hipnotizado seu “cachorrinho”
– e isso pois, supõe uma ética no uso da hipnose). É fácil o hipnotizador
manipular o hipnotizado até inconscientemente. Mas parece que deu resultado e
que Freud descobre um fato inédito, esquecido do analisado, e que o consciente
escondia recalcando-o.
Mas Freud é um cientista honesto e consegue bons resultados,
mas é humano e não um Dr. “Todo saber”; pode cometer erros que ele mesmo reconhece.
Inconscientemente pode induzir o analisando a dar informações deturpadas. Será
que para o paciente esse método funciona? Parece que sim, mas há recaídas. A psicanálise acredita com o
eu cartesiano “tudo saber” e, diz que esse eu pode ser enganado pelo inconsciente.
O eu não é um pêndulo que balança por cima do real. O eu consciente faz parte
de outros eus (inconscientes). Fernando Pessoa! Mas esse inconsciente também é
fruto do meio social. “Ninguém fica histérico sozinho” e, mesmo se essas pessoas
são ausentes ou mortas, elas continuam vivendo sua psique de analisando.
A grande virtude de Freud e ter desligado a psique do sistema
fisiológico, até o ponto de inventar um novo esquema=inversão. A psique age no
corpo e o deixa doente = a histeria e outras doenças.
Na área de ciências é uma verdadeira revolução; exatamente na
mesma época em que Einstein revoluciona as teorias do universo. A ciência deixa
seu lado burocrático, para com o artista “mergulhar”no problema e esquecer a
toda potência do eu cartesiano.
Mas a virtude de Freud é de saber conservar esse espírito
científico numa área movediça como é a
psique humana. Ele pode ter se enganado em certos casos, mas isso vem do
princípio de incertezas da psicanálise. A ciência às vezes se engana
(geocentrismo) e, a medicina mais ainda.
Freud é prudente como um velho sábio chinês e, tem a modéstia
de se desculpar quando erra.
Além de sua obra em livros, há de considerar a personalidade
do Dr. Freud e reconhecer nele um “honnête homme”, um “gentleman epistemológico”
que sabe que lidar com seres humanos não é lidar com ratos brancos de
laboratório. Trata-se de um caso excepcional de lucidez pesquisadora e crítica.
A psicanálise surge como remédio para uma ciência que estava
cheia de cientificismo e que achava que já tinha descoberto a chave do “mistério”.
Freud como Einstein. Recoloca os
relógios nas suas horas: entramos na era do indefinido, e isso, na própria ciência.
E curioso notar que os três homens que foram os pilares do século
XX, foram três judeus: Marx, Freud e Einstein. Não é uma coincidência, porque a
comunidade judaica é, por excelência, ligada ao livro. O que faz com que nossos
judeus ocidentais sejam ligados aos livros; quer dizer, estudiosos.
A verdade científica é independentemente das ideologias, que
são aliás, filosofias de botequim ou de mercearias.
Gilbert Chaudanne, escritor, pintor e crítico.
Muito esclarecedor. Me levou a uma entrevista que ele fez em estaçãocapixaba. Estou lendo-a.
ResponderExcluirNatanael, você iria gostar de dialogar com o Chaudanne. Estar na presença dele é de uma riqueza incalculável. Sempre surpreendente os encontros com ele.
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