sexta-feira, 23 de março de 2018

Ticumbi de Conceição: A realeza negra emergindo nas grandes noites







                    Mestre Tertolino Balbino (Terto), em primeiro plano; seguido do contra-guia Berto e primeiro congo, Domingos(Pintinho).




Nas noites de quarta e quinta-feira, dessa semana que se finda, o Sesc  Gloria, recebeu o glorioso Baile de Gongo de São Benedito, denominado Ticumbi de Mestre Terto (Tertolino Balbino), de Conceição da Barra; numa parceria inédita, onde prevaleceu a troca de saberes. O Ticumbi de São Benedito, emprestou seu brilho ao subir ao palco do teatro do Sesc Glória, juntamente com a Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo, sob a regência do maestro titular, Helder Trefzger.

A sensibilidade artística, do maestro Helder Trefzger, o potencializou para conceber esse projeto valioso, que traduziu nesse grande encontro de troca de saberes, importantíssimo para a cultura, e para reafirmar a potência  afro-brasileira representada, imponentemente, no Baile de Congo de São Benedito dos pretos. Foi de uma emoção transbordante e uma alegria imensa de se ver o Ticumbi brilhar no palco do grande teatro, com uma estética do belo numa harmonia entre o erudito e o popular. Era a realeza negra, com suas cores negadas pelo homem branco; com suas coroas de flores emergindo na grande noite.

Tem toda razão o antropólogo e professor, Jefferson Gonçalves Correia, ao afirmar que, "a carga simbólica desse encontro é muito grande". Certamente, a sua grandeza se deve muito ao simbolismo presente nas tradições culturais e religiosas das comunidades afro-brasileiras, do Sapê do Norte; preservados graças ao empenho de grandes mestres do passado, que partiram para a eternidade e deixaram o seu legado. Legado esse que graças a sabedoria do também grande Mestre, Tertolino Balbino, que desde 1954, como guardião da dança e da tradição que rege o Ticumbi de São Benedito, juntamente com os demais congos, o mantém até os dias atuais.

O Baile de Congo de São Benedito, além de se ter uma dimensão simbólica espiritual, tem também uma dimensão social para a comunidade do Sapê do Norte, que carrega em si suas crenças e costumes tradicionais. Embora, equivocadamente, haja interpretações de que se trata do folclore capixaba. "Houve e há toda uma tendência de ver essas manifestações do Ticumbi como algo "folclórico". Ora, esse "folclore" é quase sinônimo de pitoresco; e o pitoresco é um Brasil para inglês ver e não um "Brasil-Brasil", que realmente se nutre de um conhecimento infuso, simbólico do mundo iniciático até." Observou, sabiamente, Gilbert Chaudanne, escritor, pintor e crítico literário. Por décadas o Ticumbi é um símbolo da religiosidade e da resistência cultural do povo quilombola do norte do Estado do Espírito Santo.

Que fique decretado o enterro dessa expressão "folclore", para denominar uma manifestação da grandeza do Baile de Congo de São Benedito. "O Ticumbi é uma cerimônia [do sincretismo religioso], e como tal chama a si forças que são da ordem do indizível." Afirmou Gilbert Chaudanne.



                                          Orquestra Sinfônica do Espírito Santo e o Ticumbi de São Benedito


E viva São Benedito, e viva o Bale de Congo e a Orquestra Sinfônica do Espírito Santo!


Zélia Siqueira – formada em jornalismo (FAESA) e artes (UFES), é fotógrafa, escritora, poeta e pintora.



sexta-feira, 9 de março de 2018

A situação de extrema pobreza no Estado do Espirito Santo




É preocupante a forma como vem aumentando o número de desabrigados nas ruas de Vitória,ES. Crianças, jovens, idosos, todos sofrendo as consequências do descaso com aquilo que é mais importante: o respeito aos direito de cada ser humano.

Um estudo feito pelo Instituto Jones dos Santos Neves,  mostrou que mais de 39% dos capixabas inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, vivem em situação de extrema pobreza. 

A pesquisa, denominada “Perfil da Pobreza no Espírito Santo: famílias inscritas no CadÚnico” mostrou, ainda, que os municípios que apresentaram as dez maiores taxas de pobreza foram: Água Doce do Norte (84,3%), Irupi (83,9%), Ibitirama (83%), Muqui (81,3%), Pedro Canário (80,8%), Brejetuba (80,5%), Mantenópolis (79,1%), Guaçuí (78,8%), Sooretama (77,3%), Alto Rio Novo (76,5%). 

Um agravante vem tornar essa situação mais dolosa: a crise politica que se instalou no Brasil nesses últimos anos.

Saíram de cena os debates sobre a erradicação da pobreza, o investimento em educação, os programas de governo para contemplar essas questões sociais que penalizam os milhões que não têm acesso aos direitos básicos.

É de se perguntar: não está na hora de haver uma mudança radical nestas eleições de 2018?

Caso esse congresso não seja renovado nestas eleições, caso os mesmos que ocupam cadeiras nas Câmaras dos deputados e senado não forem defenestrados pelo voto, o espectro das mazelas sociais que grassam nas pequenas e grandes cidades tenderá a  aumentar cada vez mais.

Zélia Siqueira – formada em jornalismo (FAESA) e artes (UFES), é fotógrafa, escritora, poeta e pintora.

domingo, 4 de março de 2018

JIM MORRISON, RIMBAUD - The Doors of the 'Temporada no Inferno'.



A um século de distância dois irmãos revoltados, mais que revoltados, transtornados diante de um mundo dito moderno; cuja principal preocupação é o TER e não o SER. E o TER leva aonde? A um bando de descerebrados dirigindo automóveis e outras máquinas e que não sabem se são homens ou máquinas.

Daí a explosão dos poetas “machos”; numa sociedade de cachorros molhados, comprados pelas grandes empresas e amansados pelos padres em nome de Deus e da “First national citybank “.

A mesma revolta, na pureza da sua violência, provocada pelo estupro perpetrado pela chamada sociedade industrial = a nova escravidão. As férias: a guerra! Tudo isso abençoado pelos Ministros do Deus de Amor e do seu filho: “Ama-se uns aos outros”... com balas.

Rimbaud, no contexto da guerra franco-prussiana de 1870/1871; Morrison, no contexto da guerra do Vietnam com seu Napalm. As torturas perpetradas pelos americanos, a bordelização geral da sociedade do Vietnam, do Laos, do Camboja. Eu estava lá, no Laos.

Obviamente esses dois poetas não são homens proletários. São puros demais, até nas suas injúrias. Mas justamente eles se revoltam em nome da justiça. Não que seja  formal, de preto, como os enterros; mas a justiça que pisa no sangue das crianças mortas.

O que nossos poetas querem não é o horror da guerra,  mas a beleza dos sexos; das penetrações dos sexos e não da penetração das balas. Porque aqueles que promovem essas guerras são desequilibrados no plano sexual, pelo puritanismo cristão ou marxista. Quem passa o tempo a fazer amor não faz guerra. É o que os hippies na época falavam com ingenuidade, mas com razão, absolutamente.

Quem foi à guerra nunca volta. Mesmo se é vivo, ele está morto por dentro, (ou volta “normal” porque é débil mental). Só os mais ignorantes se vangloriam de ter ido à guerra e de ter matado. Talvez não contam as safadezas: estupros, morte de mulher e crianças; torturas que fizeram.

Não quer dizer que os comunistas do Vietnam do Norte eram uns santinhos. Era outra variação sobre o tema morte e safadezas, estupro.

Que desses horrores pode-se extrair poesia; aí que está o x da questão. Mas é simples, a poesia não é “a Rosa ausente de todos os Bouquets”, como queria Mallarmé. A poesia pode ser a bala que vai matar os vendedores de escravos, dos dois lados: capitalistas e comunistas.

A poesia pode ser violência e em certas épocas, como aquelas de Rimbaud e Jim Morrison, ela tem que ser violência ou pelo menos traumática e criar a conscientização. Em geral as poesias escritas aos grandes chefes, Hitler ou Stalin, são boas para limpar a parte inferior do nosso corpo; porque a poesia exige algo que se parece com a justiça, pelo menos em símbolos, já que a justiça em si é uma abstração ou uma perversão, para alguns casos de pureza jurídica.

É um erro achar que Jim Morrison era apenas um rockeiro, (aliás o rock é algo incontornável), há de se reconhecer nele um poeta. Ver a música “This is the End”, que quase não é cantada no início; à maneira de Bertold Brechet, com seu “Sprachgesang”, mas que termina numas explosões de bombas. Algo belo e insuportável, como o último movimento da nona sinfonia de Beethoven. 

O problema é que o grande público acha que a poesia é um delicioso chocolate suíço, que se saboreia no seu quartinho “fora do mundo”. Há a poesia de Baudelaire que diz: “Anywhere out of the world".

De qualquer maneira, todo homem dotado de uma sensibilidade mais ou menos equilibrada se torna louco. Não porque ele tem problemas, mas porque ele vive num mundo que é louco. É só pegar as "informações" na TV ou no Jornal e se você é normal, se dá conta de que estamos vivendo num manicômio, no chamado "mundo moderno", sobre o qual Rimbaud já tinha dúvida no que se refere a sua saúde mental. E que, com Morrison, num país em que é a excrecência tétrica do espírito ocidental (EUA), esse "mundo moderno" criou o homem unidimensional (H. Marcuse); o homem sem interioridade; o homem oco (TS. Eliot).

Diante dessa situação, os que são bem vivos como Jim, Arthur Rimbaud e suas gerações, representam uma ameaça para o "sistema".

A morte de Jim Morrison, em Paris, é cercada de mistério; já que usando heroína e fiscalizado pela CIA, um desses pastores SS pode ter colocado um veneno no pó. Curiosamente, Jimi Hendrix, Janis Joplin, toda essa geração morre, oficialmente, de overdose. Mas os EUA não tem por acaso, como animal totem, a Águia - que é um predador.

No caso de Rimbaud, seu talento voava alto demais para os pilares de cabarets, que se auto-denominava poeta em Paris e passou despercebido. Por isso e por outras razões mais profundas, ele jogou sua poesia no lixo e foi traficante de armas na África. Logo ele que detestava espírito bélico, parece se renegar - uma espécie de suicídio mental, fazendo enormes esforços para ficar rico. Já que ele entendeu que quem tinha razão eram os que tinham dinheiro e, consequentemente, poder - a justiça: "o rico só tem problemas, o pobre é louco e marginal".

Rimbaud saía da "Commune de Paris", na França, (Revolução de 1870/71) e Morrison fazia parte de um Império, (A Águia), que se dizia República, mas que visava a dominação universal. Nos dois casos é um grito de liberdade - num país, a França, que tem essa "libertê" no seu hino nacional e num outro, os EUA, que tem uma enorme estátua da liberdade como entrada no país - presente da França. Dá para ver que os "mafiosos" da liberdade trabalham de mãos dadas.

Tanto Morrison como Ribaud, terminam tragicamente e, logicamente no fragelo.

Nestes dois países, que cantavam a liberdade, se praticou guerras de colonização com massacre e tortura. E como o poeta é a antena da vez, ele é o primeiro a avisar que tudo isso é cinismo puro da civilização ocidental. USA=NAPALM - FRANÇA=TORTURA NA ARGÉLIA.

Se Deus é Brasileiro, o diabo é americano e o francês é quadrado.


Gilbert Chaudanne - escritor, pintor, crítico de arte e de literatura